27 novembro, 2010

Palindrômico

R: desiludidos, vamos passar nossa noite assim?
T: não faz sentido. Deveríamos nos encontrar numa rua em tons de terra, sentar num pub indecente, escrever poesias no guardanapo sobre essa droga de amor que nos sustenta.
R: deveria falar horas sobre essa virtude que mais parece uma desgraça.
T: e beber toda a mágoa diluída em álcool.
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Para o Poeta.  

Seu rosto invadiu a memória aflita e guarneceu as paredes de uma luz pálida e tímida.
Sorriu.
E bastou para que o coração o quisesse para si.

Seu nome não é só feliz palindromia:
é o descer do rio sob a chuva intensa
e gotas e gotas que serão mar.
Lágrimas em gotas que serão mar no planalto.

Há mais melancolia que timidez no sorriso do poeta.
Seus olhos se fecham em sonhos,
as asas se abrem em vôo.
A cabeça deseja recostar-se em pranto;
os cabelos desejam receber afago.

No espelho, o poeta é ele mesmo:
aquele, de todos os ângulos, desconexo.
O poeta se perdeu no mundo,
mas está lá toda sua vontade de amar;
o desejo manifesto em verso o atormenta.
E sua poesia não é senão a minha
invertida no espelho:
Eu e Remer somos o mesmo poeta, desconsideradas as ortografias.

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Eu não lhe devo nada, poeta, nem este poema; todas as fogueiras e fagulhas que me foram acesas, todas elas eu deixei que queimassem e se consumissem. Eu sou um tanto estranha e, muitas vezes, incoerente naquilo que digo. Às vezes, a aresta é o único lugar que me cabe, eu me torno momentaneamente racional, eu analiso tudo o que penso, eu não digo nada. Eu me entrego ao mundo que construiram para que eu morasse; um mundo, no entanto, que não é meu, onde eu não sou, onde eu sequer existo. Lá eu fico até que um belo par de olhos doces me venha guiar pela luz, me encher de inspiração e ternura. Tantas noites eu voltei ao meu mundo pelas tuas mãos, tantas vezes eu me orgulhei de ser quem sou, mesmo sendo quem sou. Não se deprima, poeta. Não há nada além da vida, não agora. Ela é esta bem diante dos teus olhos, não há nada maior nem mais imediato que se possa apreciar. Seja livre na medida dos teus pensamentos, vá para o seu mundo. Lá, o planalto é bem pertinho da serra.

2 comentários:

Vinícius Remer disse...

eu lhe devo tudo..

Tácila Rubbo disse...

Delirei saboreando as palavras, com as quais me identifiquei tanto.