22 novembro, 2008

Deparei-me com a maldita constatação de que fiz de entender a vida o motivo pra vida, e não a consequência dela.

maldito Aristóteles.

Sonhei

Eram lindas pedras azuis amontoadas umas sobre as outras. Sobre elas, limo.
Alguns amigos esperavam sobre a ponte que eu me jogasse de lá. Diziam que se livrar da vida resolveria. Eu recuei. Eu tive medo. Depois acabei desistindo.
Ao fundo, escutei alguns cavalos trotando e me virei. Eram pangarés feios e sujos, levavam pessoas mais feias ainda. E era um mundo que eu não conhecia, com casas velhas demais e um chão lameado, quase movediço. Eu pronta para escorregar.
Acabou.

09 novembro, 2008

Diana

Foi n’um reboliço de auto-afirmações que a conheci: era Diana. E d’aquilo que eu imaginei ser uma senhora ranzinza e moralista surgiu a menina de alma mais penetrável que já conheci. Seus olhos vagos, sempre buscando o horizonte, sempre horizontais. Aparece quase sempre em preto e branco diante de meus olhos. Mais em preto, é verdade. É uma negrinha de cacau. Doce-amarga negra de cacau.

Diana, essa tola, não gosta de elogios. Bem verdade é que Diana adora elogios, mas é caprichosa que só ela. Gosta de antes ser bem ferida, Diana se recusa a receber um amor singelo. Precisa mesmo é de um amor nascido nas tempestades: semi-afogada na praia, ama.

Tanta é sua carência que ela mendiga. D’aqueles pedintes mal-educados que soltam cusparadas quando a esmola é pouca: Diana não aceita migalhas. E, orgulhosa, joga o amor no chão, quando acha que é demais, ou por diversão. Ela bem sabe como pisar no coração de uma mulher...

É dada a demasias, mas não há quem se importe... É porque também Diana é muito intensa, e arrisco dizer que isso é coisa da idade dela. Ela mesma já percebeu o quanto desliza nos próprios excessos. Mas Diana é linda deslizando também, e também quando precipita-se, se abate e cai. Diana é linda, ainda mais, quando se ergue em silêncio, sem sufoco ou alívio, só respirar.

Ô mulher p’ra gostar de mim é Diana. Me persegue e, de tanto, se tornou amor. Não é delírio, não é abuso. Abusada é Diana por si só, minha linda. Que ela não aceite aquilo que eu sou, por mim tudo bem. Que seus amigos não gostem de mim, não importa. Que ela questione minhas escolhas, simplesmente não faz diferença. Mas que ela saiba que eu a amo, que meu eu-lírico a ama, que meus sentidos e meus desejos a amam. E que se não houve antes uma declaração de amor tão inequívoca é porque faltou dignidade para assumir que Diana, embora caiba inteira em meus pensamentos, simplesmente não cabe no meu vocabulário.

08 novembro, 2008

E o tempo (s)urge

Eis que envelheço. Aos vinte e um eu já tenho pequenas porções de pele enrugadas ao redor dos olhos e da boca, acho minhas orelhas e meus nariz enormes, tenho um gosto musical duvidoso, sou ranzinza e deliro. Envelheço. E é tão triste, tão decadente, que essa velhice chegue antes da hora que deveria chegar, supondo que há uma hora pra essas coisas.

Aliás, decadente é a velhice chegar em qualquer hora, anunciando a morte, esculpindo o fim nas feições. Biologicamente, eu sei, é um processo inevitável. Aliás, penso que só acontece porque o sangue corre. Se o sangue andasse, teríamos no mínimo uns trezentos anos de juventude antes de começar a perecer diante da vida. Na verdade, tanto faz. A verdadeira expectativa de vida é a morte.

Mas, envelhecer... é mesmo necessário? Eu não entendo toda a comunidade científica se mobilizando para descobrir a cura do câncer, ou da AIDS, ou do Alzheimer... Alguém aí já se perguntou cadê a cura da morte? Porque, sinceramente, pra mim tanto faz morrer de pneumonia, acidente de avião ou dormindo. Melhor mesmo seria não morrer. Ou, se for pra morrer, morrer jovem, antes de se tornar decrépito e senil.

Não existe honra em envelhecer. Não importa os grandes feitos da vida depois que você se torna dependente e miserável. Envelhecer "mentamente jovem" deve ser ainda pior, ver seu cérebro em plena atividade aprisionado num corpo que já não se agüenta. Andei reparando como os idosos se movimentam lentamente. Acho que não tem nada a ver com a sustentação física. O fazem, simplesmente, para prolongar o que pode ser seu último movimento. Esperar a morte chegar naturalmente é brincar de roleta-russa com o tempo. Coisa mais deprimente.

Pois é mesmo uma pena que a experiência venha com a velhice e não antes dela. O que fazer com tanta experiência quando não se pode experimentar mais nada? Pode ser uma visão equivocada, mas não quero envelhecer. Aliás, no ritmo que vou indo aos vinte e um anos, não precisarei de mais do que trinta para estar completamente caduco.

Amanhã, ontem.

Eu tenho verdadeira adoração pelos meus raros momentos de suposta inteligência, como se eu fosse - às vezes - aquilo que eu penso que sou - sempre. É um pensamento sobre o pensamento, uma loucura metalingüística, Wittgenstein ia adorar. Eu devo ser esquisofrênico, me acho esquisofrênico às vezes. Talvez bipolar... Eu preciso mesmo arrumar um nome pra isso? Essa fixação em saber da vida e da morte e dos seus arredores, ao invés de viver. Lá me vem um momento.

De alguma forma eu me sinto obrigado a escolher um caminho pra seguir, um caminho sem erros. Eu sei, eu sei, "a estrada é p'ra caminhar". Não, não sou eu. Tem uma vozinha cantando "Sonhos e Pernas" na minha cabeça, magnífico Vander Lee. Delirando. Não, quanta bobagem. Estou me amparando de argumentos p'ra tentar distorcer os verdadeiros sentimentos, uma maneira de justificar essa preguiça interior. Eu não tinha um poema sobre isso? É uma mistura de encanto pelo mistério, conformismo e qualquer coisa de tristeza. Eu tenho tudo dentro de mim, só não encontro. Eu sou um quarto bagunçado.

O tempo vai passando e eu, estagnado, sinto como se nem nascido eu tivesse ainda. Momento: a vida não faz qualquer sentido. Nada faz. Toda essa commotion em torno da vida não muda o fato de que a morte a interrompe sem aviso prévio. Fim do momento. Na verdade, não é o fim; mas como costuma dizer Luísa, algumas confissões não resistem à tecla Enter. Vai ser sempre assim, né? Essa infelicidade, esse discurso - confesso - retórico, enfadonho e blablabla... Falarei de flores, talvez, ou das conversas que tenho com begônias ou com o vento. BOM DIA, AMIGO VENTO! Talvez contar que meus óculos se quebraram depois de tanto serem consertados e soldados e colados e parafusados. Eu estou mais de seis graus mais míope em cada olho e não enxergo nada que esteja mais distante que quinze centímetros do meu rosto. Fui escolher um novo e achei uma armação muito bonita. Vermelha. Com strass nas pernas. Nunca entendi porque chamam as hastes dos óculos de pernas. Enfim. Fui fazer exame de vista e ai!... Minhas pupilas estão agora parecendo duas imensas jabuticabas espatifadas no castanho cor de barro da minha íris. Saudade de barro, saudade de chuva. Saudade de estar em dia com meus delírios. Tem sido difícil delirar coisas novas, o mundo me sussurra as mesmas coisas, sempre! Veja só, eu posso ser agradável. Meu hoje é que nunca dá certo. Amanhã, ontem. Eu só sei viver de pedaços inúteis de vida.

shit happens

Eu odeio me sentir clichê. Me sentir sozinho na multidão, chorar rios de lágrima, sentir que posso mudar o mundo, ou não. Eu me sinto inferior quando sinto o mesmo que o restante da humanidade diz sentir. Me parece que cada um, ou eu, pelo menos, deveria ter sentimentos exclusivos e surpreendentes. Grande asneira, é verdade. Sendo eu homem não deveria me sentir como um ornitorrinco, um manjericão ou uma pedra. Tenho mais é que sentir todas essas coisas das quais estou cansado de sentir, mas que é o que me resta.

Ontem estava eu, sozinho na multidão, pensando na grande bobagem que minha vida tem sido: essa rotina de objetivos curtos, vãos e descartáveis. E eu juro, só queria me adaptar. Mas eu sou terrível, duvido até das minhas certezas. Vivo de encontrar erros, mas não vejo um acerto, sequer. Então, como saber o que é o errado?

E todo mundo precisa fazer diferença nesse mundo? Somos mais de seis bilhões, se todo mundo resolver fazer a diferença vai virar um caos! E não foi tentando fazer a diferença que criaram a bomba atômica, descobriram a radioatividade, guerras e guerras e guerras?... Se sou contra a evolução? Bem, estou aqui de frente a um notebook escutando músicas num ambiente tão frio que só falta nevar. Não, não sou... Até defendo, se for o caso. Inclusive, defendo. Boas pessoas inventam boas coisas com bons propósitos. But, shit happens. E pessoas más com maus propósitos transformam coisas boas e bem intencionadas em máquinas mortíferas. Estas vão para o inferno. Rá! Não, eu realmente não acredito nisso. Sabe o que é isso? Justificativa para a preguiça interior. Acompanhe: partindo do princípio que eu tenho boas intenções e faço coisas boas, but shit happens e pessoas más farão das minhas coisas boas coisas ruins, chego à conclusão de que o melhor é não fazer diferença nenhuma no mundo. Preguiça, preguiça... deveria ser proibido sobreviver ao tédio.

Por fim esse amontoado de idéias faz com que eu me sinta vazio, minhas boas idéias nem são boas de fato, não chego a conclusão alguma. Eu me sinto do lado de fora, mas eu sei que não estou. Devo, aliás, estar bem no meio das estatísticas, inserido em uma maioria qualquer que eu, simplesmente, desconheço. Talvez entre as “pessoas que complicam a vida demais” ou qualquer coisa do tipo. Dói ser igual. E dói, na mesma proporção, ser tão diferente.

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P.S.: Como shit happens, Ana Maria esteve indisposta literariamente na última semana, então pulamos seu post. Voltamos, na próxima semana, com a programação normal. Grato.

.S.: Segundo a wikipédia, "shit happens" é um equivalente para "c'est la vie". De qualquer forma, só isso me vêm a cabeça. "Nosso exemplo vivo de hoje... porém a vida é uma caixinha de surpresas."

de.ses.pe.ro

Desespero é meio assim: você não sabe se corre, se deita, se chora, se grita. Eu optei por chorar um bocado. Porque, às vezes, eu sou fêmea e adoro me ver chorando no espelho. Eu e minhas confissões... Tem dias que realmente beiro a loucura e começo a escrever palavras soltas e aleatórias em cadernos velhos. Depois elas fazem algum sentido, ou não, mas são sempre muito bonitas de se ler depois, quase um poema. Mas hora e outra volta o desespero,um aperto, um medo. E eu só tenho chorado.

Tem aqueles meus dias de desinteresse completo pela existência do mundo em que nada me desespera. Me falta perspectiva, me falta esperança. É que a certeza da morte às vezes desespera e eu penso que não vai dar tempo de fazer tudo o que eu ainda não sei se devo fazer. Em outros dias mais amenos, a certeza da morte me dá é sono, preguiça de fazer coisas que perecerão assim como eu. Acho que também é uma forma de desespero, uma quase-teimosia em viver ou em ceder ao processo de morte.

Eu tenho que dizer muitas coisas que andam me destruindo, mas tem sido difíceis esses dias, eu e meus dramas. E prefiro não propagar essa doença epidêmica, essa contrariedade, esse desprazer, essa aflição. E paro por aqui. ‘Tá dando um desespero, sabe?

Esses humanos e eu, a ovelha

É assim: desde algum tempo que não me dou bem com a idéia de grandes templos, igrejas e afins. Não, eu não tenho nada contra nenhum deus. Menos ainda contra a fé. Afirma a Bíblia que Jesus dizia: “A sua fé te salvou”, se bem me lembro. Nada contra a fé, tudo a favor. Voltemos às edificações. Primeiramente, nunca entendi (e levarei em conta a fé cristã na qual fui educado ou deseducado, como preferir) porque, sendo Deus onipresente, eu deveria ir a um lugar específico para “encontrar-me” com ele. Segundo, porque algumas igrejas (templos ou afins) são tão altas. Sempre pensei que com aquela altura toda seria possível construir dois ou mais andares com quartos que pudessem abrigar os necessitados. Não seria esse um ato de bondade e generosidade, dignos de uma alma cristã? São só perguntas. Então, eu e minhas perguntas temos uma, digamos, aversão a essas edificações faraônicas não-supostamente-pagãs. Mais me parecem grandes shoppings centers, talvez até mais lucrativas. Volto a dizer que não é uma crítica a fé ou a deus (o qual, sendo onisciente, sabe bem disso). Sequer é uma crítica. É só uma opinião. Uma opinião crítica. Enfim.

Soberba, meus caros. É o que me leva a questionar. Esse ímpeto ateu de não precisar de nada. Mas eu não sou ateu, que fique claro. E é também por isso que tenho tantos problemas com o-que-quer-que-seja-que-chamam-de-deus, e com os-que-chamam, esses humanos.

Ainda assim, contra a vontade, às vezes se faz necessário participar de algumas conveções religiosas, seja pelos que chegam, pelos que casam ou pelos que vão. Pelos que vão, várias vezes, é necessário de dizer. Sétimo dia, um mês, um ano, dois anos, três anos... Celebram a morte de um até que um outro morra. Nunca entendi. Bem, mas só de pensar em assistir uma missa inteira começo a me sentir o Damien, d’A Profecia, que tinha ataques histéricos quando se aproximava de igrejas e, por isso, nunca fora batizado. Deu no que deu. Então me sento naquele banco como se feito de cactos e me remexo pela hora enfadonha que segue. E vou, como um abutre, admirando a podridão do lugar e de seus freqüentadores. QUE BOBAGEM! Não é nada disso. Eu estou apenas colocando em deus a culpa que vejo nos homens, falando besteiras até me fartar. Hipocrisia, e só.

A questão é bem mais simples: eu não consigo me encontrar dentro de tudo aquilo que sou capaz de pensar. Empiricamente falando, eu reconheço a fragilidade do conceito de Deus, ou qualquer outro deus que seja. Não existe sustentação que não seja a fé. O problema, ou a solução, é que a fé não precisa de sustentação, ela é auto-sustentável na sua existência. Se precisa de argumento não é fé; se é fé, não precisa de argumento. E não se pode provar. Por outro lado, a idéia de um todo surgido espontaneamente no/pelo universo não me parece mais racionalmente satisfatória que a de um deus inventado. Falta a magia que tanto aprecio nos atos. Eu beiro a sabedoria e a demência fácil, fácil.

E por causa dessas considerações sem respostas que eu crio ainda mais perguntas sobre as possibilidades e as responsabilidades do meu ser em vida, do ser humano que sou (?). Volto a dizer que não acho certo poder fazer perguntas cujas respostas eu não possa dar ou aceitar. Vai ver é mesmo só uma questão de aceitar, aceitar ser ovelha. Pensando bem, é isso que eu sou, uma ovelha, do grupo das questionadoras, do grupo das ovelhas cegas que acham que não são ovelhas. Mas ovelha.

E no fim da missa desse final de semana quando as perguntas me comiam, uma bela garotinha de grandes bochechas rosadas e longos cachos negros me sorriu. Notei que, enquanto me perdia em minhas perguntas, meus olhos apontavam para seus joelhos e, com certeza, ela imaginou que eu admirava seu vestido cor-de-rosa ou suas meias coloridas. Reparei, desta vez de verdade, em suas meias e ela me sorriu maior. E pensei que crianças são mesmo bacanas, naquilo que de melhor se pode extrair da palavra. Ela, com certeza, não deve ter questionamentos sobre o valor da vida, o sentido da vida, a vida em qualquer parâmetro... A pergunta de resposta mais constrangedora que ela formulará do alto de seus 6, talvez 7 anos, talvez seja “de onde vem os bebês?”. E ela saberá sem qualquer drama que não o dos pais. E após a imensa angústia de ter que aceitar que Sócrates estava mais é certo e que eu também só sei que nada sei, me veio uma inexplicável paz, que me disse baixinho pra eu me calar. E deixar de ser hipócrita.

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P.S.: Imperdoavelmente, escrevi mais um texto longo. Oh, deus.

Por poder nascer no asfalto.

"[...]

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

[...]
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio."

----------------------------------------------------------C.D.A. (A Flor e a Náusea)



Liberdade é daquelas coisas que não se deve conceituar para não cair em contradição. É como o amor. O amor só diz da incapacidade de dizê-lo, foi o que eu sempre achei. E conceituar liberdade... ora bolas, o que é? Delimitar liberdade entre palavras que não lhe cabem?

Embora contrarie algumas tendências, sempre fui contra a idéia de que ser livre é algo como voar. Ao contrário, liberdade pra mim é poder criar vínculos, poder enraizar onde houvesse condição. Liberdade é ser e estar. Ser o que inevitavelmente é, estar aquilo que se deseja estar, e não estar mais, quando não for mais para estar. E voar, mas só se quiser. Nada te impede de, tendo criado raízes, decidir que o lugar não é tão bom quanto era e mudar.

A tendência é crer que a liberdade é poder voar. Mas Fernão Capelo Gaivota voava e nunca se sentiu livre. As gaivotas de seu bando só voavam para pegar comida e só alcançavam altura suficiente para tal. E Fernão aprendera com elas. Mas em seus questionamentos, em um belo dia, voou mais alto, onde jamais qualquer gaivota teria ido por instinto. Não houve, no entanto, quem o apreciasse. Ao contrário, Capelo Gaivota foi hostilizado pelo bando. E agora, provando da liberdade, Fernão já não entende como um bando de gaivotas não compreendem a beleza de poder ser mais. Desenvolve-se daí um grande e belo livro/filme que trata da liberdade, dos limites e dos desejos.

"Uma flor nasceu no meio do concreto", disse Caramelo. Uma flor que, como a de Drummond, é rejeitada por não estar onde "deveria" estar. Mas, desde que o mundo é mundo e o homem é homem, nós temos essa mania de achar que o que fabricamos é anterior ao que, de fato, já existia. Mania de achar que o asfalto veio antes da flor. Mania de achar que a flor só nasce na terra. E mania de arrancar a flor, porque a vida nascendo em qualquer lugar incomoda, é quase um sentimento de anarquia alheia. Inclusive, já que falei disso, anarquia é outra coisa que os conceitos corromperam. Lindo seria um mundo anárquico, onde flores nascessem nos asfaltos e perfumassem a cidade. Mas fomos condicionados ou nos condicionamos (para sermos justos com a culpa) a achar que anarquia é bagunça. Anarquia é a falta de um governo comum. Fosse o homem um ser tão racional como diz ser não precisaria de um Estado para o representar. É só uma opinião, entre tantas outras que me arrisco a dizer por aqui. À flor.

Por uma questão de aceitação, temos também outra mania incorrigível: a de separar. Homens sempre se apaixonam por mulheres, mulheres sempre por homens. Homens dirigem melhor, lugar de mulher é na cozinha. Brancos ricos. Negros pobres. Homens de azul, mulheres de rosa. Parece inocente, mas para sair de separações simples e chegar a prussianos matando judeus e homossexuais é um pulo. Porque precisamos nos encaixar. Mas se encaixar no todo é chato, por você seria só mais um. Então você divide o todo na metade, diz que a sua metade é melhor e mata a outra metade. Quando a outra metade virou minoria - seja porque foram mortos ou porque passaram para a sua metade - e a sua metade é quase todo, você redivide o todo em outras metades e recomeça o processo. No final, você tem grupos de pessoas absolutamente iguais que se odeiam. E cria lugares onde só se veste azul, onde só pode ser vermelho, onde só se torce pro verde e onde flores só nascem na terra. Flores no asfalto causam nojo, e são arrancadas. Quem se compadece da flor não faz parte do grupo. Nem quem voa por prazer. Ou (re)aprende a voar por instinto, ou sai do bando.

É mesmo um milagre da vida (sábio Caramelo) nascer e permanecer no asfalto. Até o próximo desejo de nascer no topo dos edifícios. Adendo poético. Ando assim. Enfim.

Liberdade é só mais um conceito. Um conceito quase particular, é fato. Mas temos liberdade de escolher o pensar sobre a liberdade. Temos liberdade de criar um conceito próprio pra liberdade. O que é liberdade pra você?

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P.S.: Post especialmente dedicado aos amigos Gabriel Pinto, que sempre vem à nossa humilde casa para beber um bom gole de absinto e filosofia barata, Luiz Felipe Leal, que nos amanhece de poesia onde é sempre noite e Diana Borges, a Dica, sempre atenta à direção de nossos olhares. E claro, à Clarinha Gomes e sua trupe de Jardim, sem os quais não haveria inspiração inicial.

Só me falta ser completo.

Somos nós, humanos, delimitados por conceitos. A finitude da vida. A existência/inexistência da alma. A necessidade. A culpa.

Amargura.

Não, não é uma crise existencial. Eu continuo a existir. Ao menos a pessoa por trás do nome que uso. Ou seremos a mesma pessoa? Enfim. Não é um problema em existir ou não, eu existo e ponto. É um problema com as condições nas quais existo. Pouco claro, eu sei.

Existe uma parte da magnífica da filosofia chamada ontologia. Platão foi o responsável por definí-la, em uma primeira instância (se bem me lembro). Se alguém mais o fez, na verdade, não me interessa. Platão fez maravilhosamente. A ontologia é o estudo do ser. E, embora sejamos levados a perguntar: "ser o quê?" por curiosidade ou por costume de achar que "ser" é verbo de ligação e quem é, obrigatoriamente, é alguma coisa, o "ser" só é. Tão absolutamente completo que sequer necessita de alguma coisa para ser. Ser basta. A ontologia sempre me impressionou. Aliás, serei sincera ao dizer que não sei se foi a ontologia em si, ou se foi Platão que sempre me enlouqueceu, ou se o acadêmico que lecionou que foi brilhante. Mas deve ter sido a ontologia mesmo... Não te causa arrepios?

É difícil entender. Tampouco aceitar. O ser humano é estranho demais pra isso. Tenta, a todo custo, absorver o universo ao seu redor. Talvez na tentativa de ser completo. Não basta ser. É necessário ser alguém. É necessário ter valores, ser amado. É necessário inventar, dizer. É tanta necessidade que me pergunto se eu sou ou se o que é são as coisas do mundo que agrego ao meu ser que, portanto, é. Sim, é claro que me incluo entre os seres humanos. Eu também absorvo o mundo para não parecer tão pequeno. Eu sou só mais um igual.

Eu me irrito com perguntas das quais não sei a resposta. Penso que talvez eu não deveria poder questionar esse tipo de coisa. Ou talvez a pergunta seja um tipo de conhecimento. E é, se pensarmos que só chegamos a um questionamento pela incerteza. A incerteza é uma certeza ao contrário, tão certa quanto. Que confuso!

Me desculpem. Não tem sido uma boa semana. Eu tenho semanas terríveis e elas me levam a conclusões ainda piores. E penso, às vezes, que já não estou na idade de questionar. Às vezes acho que falta muito pra ter certeza. Mas quando surge um vazio (ou quando o percebo) eu fico meio morto, meio sem querer ser nada. Na verdade, não me falta muita coisa. Só me falta ser completo.

O tempo, o de repente e eu

Acho perdas de tempo valiosas. Realmente necessárias. Acho mais: acho que perder tempo é esplêndido!. Quanta coisa expulso de mim quando me proponho ao nada, quando me entrego ao vazio da minha imaginação. De quantas coisas me preencho enquanto tento não pensar. E não é exclusividade de ninguém pensar em generalidades, em possibilidades, aleatoriedades. Pensar nos caminhos que nos levam a qualquer lugar, na necessidade de determinadas crenças, ainda que violentamente óbvias. Eu me sinto agredida por ser levada a pensar nisso, por não ter opção dentro das minhas opções, por não haver resposta.

Mas não há nada mais deprimente que a necessidade. Ter que ter, ter que ser, ter que pensar, ter que crer. E a vontade de sair gritando: "Eu não tenho NADA!". Isso eu tenho. Eu, particularmente, acho coisas inevitáveis muito tristes. Ter que respirar é tristíssimo, essa dependência do inanimado, algo poluível, algo contaminável. E acho triste também passar a noite sem dormir. Só um adendo nada a ver. Mas eu não tenho que ser racional.

Meu tempo perdido é sempre disperso. Nunca sequer me lembro exatamente do que estava pensando no momento anterior porque o pensamento corre a uma velocidade que a memória não consegue carimbar. Mas seja lá por qual caminho, num de repente qualquer, me vem uma idéia incrível de como as coisas são possíveis, todas elas. É como se tudo pudesse mudar. É como se aquilo que os gregos chamavam de Mundo Inteligível viesse ao meu domínio e eu desvendasse todos os segredos de tudo que há. E a idéia foge. Só isso. Só foge. E não volta nunca mais. E mesmo num mesmo vazio, numa mesma angústia ou numa mesma paz de espírito a idéia nunca retorna. O de repente é sempre outro.

Questionar o que é a vida, quanto ela vale e qual a fronteira entre viver e existir é vão. Sempre vão. A vida não se pode medir. Não que devamos interromper o processo cognitivo simplesmente por não haver possibilidade de um conhecimento completo. Bem, talvez devamos. Mas sob essa perspectiva tudo é vão, mesmo respirar. De outro modo, o que vivemos é nossa única certeza. Não importa se a crença nos permite acreditar numa vida anterior ou posterior a esta, o agora é certo. Então, só resta viver. Pensar nas possibilidades improváveis. Almejar conquistas impossíveis (a tal moeda do topo). E saborear a esperança do que jamais será vivido.

um final de Distância e um início de Saudade...

A distância cria parâmetros que não existem. É como o tempo, ou o espaço. Ou como deus. São conceitos jogados na alma que parecem resolver problemas. O tempo cria as regras e as marcações do que jamais poderá ser contado ou marcado. O sentido de espaço limita algo excessivamente livre. E deus está sempre onde deve estar, fazendo o que deve fazer. E é sempre um alívio pensar que o tempo é contado, o espaço é limitado e deus existe. E a distância?

A distância também é um alívio. Ela desobriga à verdade ou à mentira. Não existe medo. Existe, sim, uma inconstância de sentimentos. Mas a distância é sempre solução. É sempre a motivação para o perto. É fato também que a distância permite grandes encontros. E permite fazer amigos de lugares desconhecidos. Goiás. Mato Grosso. Rio Grande do Sul. São Paulo. Espanha. São espaços que conheço através do olhar de quem não conheço. Mas são próximos e sempre bem-vindos. Não têm defeitos, têm humanidades aparentes, mas pouco notáveis. E amo. Abraços, inclusive. E a saudade?

É através da falta que a saudade se estabelece, indiferente à distância real. Porque, segundo conceitos matemáticos, físicos ou sei lá quais, a menor distância entre dois pontos é uma reta. Já pensou nisso? Uma reta... A saudade sempre faz curva. Ou entra por um ponto de um buraco negro e chega logo no outro. Como a saudade é bela. É cheia de encantos e facetas. É quase uma entidade absoluta. Será que não é? Não existia nenhuma deusa grega da saudade? Poderia ser uma bela mulher esguia, sempre vestida com leves roupas, que ia sempre onde os ventos a levassem. Por ter uma paixão tresloucada por Zeus, a ciumenta e soberana Hera a condenou a viver longe de seu amado. Se divertia separando pessoas que se queriam de alguma forma. Sempre vagava na companhia de Dionísio e, quando meio alterada pelas graças etílicas, se punha a chorar aos pés de Héstia. Seu nome? Se meu grego enferrujado não me engana, é algo como Disponidéia...

Mas a saudade-sentimento é sempre vinculada à distância. Não sei se para que saudade seja sofrível, ou só para que ela consiga existir. Quem sabe? Talvez Disponidéia.

02 novembro, 2008

Então

Isso é hora. Na verdade, deveria ser mais cedo, mas uma chuva de coisas sem sentido algum aconteceram e quando Murphy resolve mostrar ao mundo que existe uma lei p'ras coisas darem errado, ele o faz. Pois bem, eu tô sem saco pra escrever algo decente, perdi minha comunicação com o mundo e tudo que eu quero é ser rica sem ter que trabalhar. Isso! E comprar essa empresa só p'ra demitir meu atual patrão. Isso! Enfim, tô azeda há duas semanas porque não consigo postar, não consigo entrar no Orkut, no MSN, no Outlock, em qualquer outra merda de forma de comunicação com o mundo, eu cansei!

E vai bloquear a mãe porque webfilter de cu é rola.